Mídia Sem Máscara - No que respeita à língua, do Brasil só vem merda
| 16 Agosto 2013
Artigos - Cultura
"Alguns
podem pensar que ao escrever “penço” estou cometendo um erro de
gramática. Não. O erro, isso mesmo, erro é ortográfico. Tanto já se
comentou por aqui em acerto e erro, adequado e inadequado, que acredito
que a confusão agora está completa."Marcia Meurier Sandri, Mestre em Língua Portuguesa UERIArtigos - Cultura
Que me perdoem os amigos brasileiros, mas já não aguento mais! Puta que pariu! Em matéria de política da língua “portuguesa”, a grande diferença entre Portugal e o Brasil é que a de que a oposição ao Acordo Ortográfico, a existir no Brasil, não é organizada, ao passo que os defensores brasileiros do Acordo Ortográfico estão fortemente organizados – e a razão pela qual os putativos opositores brasileiros ao Acordo Ortográfico não estão organizados é a de que (apesar da aberração do Acordo Ortográfico) pensam que “o Brasil vai tirar vantagem”. Mas não vai.
Enquanto
que os defensores portugueses do Acordo Ortográfico andam
envergonhados, os defensores brasileiros do Acordo Ortográfico andam
orgulhosos. E esta diferença faz toda a diferença.
Vamos
definir alguns conceitos recorrendo a um dicionário, antes de
prosseguir na desconstrução deste raciocínio tipicamente brasileiro.
Ortografia (do latim ortographia que por sua vez deriva do grego orthographia): parte da gramática que ensina a escrever correctamente as palavras de uma língua.
Gramática: (do latim grammatica que por sua vez deriva do grego grammatike): tratado dos factos da linguagem falada e escrita e das leis que a regulam.
Convenção: do latim conventio, que significa “pacto”: resultado de um acordo explícito ou tácito.
Já agora, a definição de “representação“:
termo que designa qualquer imagem ou pensamento que se forma no
psiquismo consciente, e que se supõe responder a um elemento exterior.
Do ponto de vista da filosofia, também podemos definir “representação”
como acto pelo qual o espírito torna presentes os seus objectos mediante
a construção de imagens mentais.Ortografia (do latim ortographia que por sua vez deriva do grego orthographia): parte da gramática que ensina a escrever correctamente as palavras de uma língua.
Gramática: (do latim grammatica que por sua vez deriva do grego grammatike): tratado dos factos da linguagem falada e escrita e das leis que a regulam.
Convenção: do latim conventio, que significa “pacto”: resultado de um acordo explícito ou tácito.
A seguir, o problema é o de saber se uma língua é um mero sistema de sinais – conforme defendido por Ferdinand de Saussurre, o fundador da linguística – ou, em vez disso, é um sistema de símbolos. E aqui está o busílis da questão.
Émile Benveniste ,
para além de ter refutado uma concepção “behaviourista” da linguagem
(que é o que está subjacente ao fundamento ideológico do Acordo
Ortográfico) demonstrou que uma língua é um sistema de símbolos e não um
mero sistema de sinais, quando ele verificou que as categorias lógicas
de Aristóteles reproduzem as categorias gramaticais da língua grega
antiga, sendo que a universalidade dessas categorias lógicas de
Aristóteles devem ser adaptadas para se tornarem inteligíveis em outras
línguas.Um sinal não é a mesma coisa que um símbolo. O símbolo tem um conteúdo, em que é simbolizado o representado (ver definição acima de “representação”), enquanto que os sinais são escolhidos arbitrariamente.
O
símbolo, para além do significado cultural que o sinal também pode ter,
tem um significado espiritual (relativo à experiência humana subjectiva
e que adquire uma experiência intersubjectiva ou colectiva) que o sinal
não tem.
Um
sinal só passa a ser um símbolo quando passa a ter um conteúdo com
relação a um representado, o que lhe retira a arbitrariedade previamente
existente. Um símbolo nunca se muda porque isso resultaria também na
dissolução do seu significado; um sinal pode ser mudado mantendo-se o
seu significado anterior.
A
ortografia, para além de ser um conjunto de sinais [por exemplo, o
alfabeto], é um sistema simbólico coeso que o Acordo Ortográfico
pretende destruir.
Muita
gente pensa que o significado da língua não se altera através da
eliminação das características etimológicas da língua, como por exemplo,
a supressão das consoantes mudas. Concebendo a língua como um sistema
de sinais, pensam que mudando a constituição de uma palavra – ou seja,
mudando um mero sinal – o seu significado mantém-se exactamente igual ao
significado anterior à mudança.
«Duravão
as Cortes e as instâncias dos povos querendo que S. A. se coroasse
dizendo que o havião aclamar. Porem S. A. impidio isso, porque os povos
estavão resulutos a isso, mais do que a pagar os tributos necessários.
Sucedeo nas Cortes em S. Roque, aonde se junta o estado da nobreza, como
em S. Domingos o eclesiástico, e o dos povos em S. Francisco, que
sentando-se acaso o Duque de Cadaval em o banquinho do Secretário delas,
que era o Marquês de Gouveia, que ainda se não começavão, o qual lugar é
no topo da casa, junto de um bofete, donde principião os bancos pela
casa abaxo em que se sentão os 30.»
- “Governo
do Príncepe Dom Pedro regente de Portugal”, citado do livro “Portugal,
Lisboa e a Corte de D. Pedro II e de D. João V – Memórias Históricas de
Tristão da Cunha de Ataíde, 1º Conde de Povolide”, página 99, 1990,
Chaves Ferreira – Publicações, S. A.
Mudando
as palavras mudam-se os símbolos – e não os sinais -, porque uma
língua, para além das palavras, tem uma morfologia e uma sintaxe que
implicam previamente uma simbologia. E, para a esmagadora maioria dos
brasileiros, este texto não é “português” mas antes é chinês: tornou-se
ininteligível. Por isso é que a literatura brasileira é muito pobre se
tivermos em consideração a população do Brasil. E o que parece é que o
Brasil, não contente com a pobreza endógena da sua literatura, pretende
exportar a sua indigência literária para todo o mundo de língua
portuguesa.
Orlando Braga edita o blog Perspectivas.
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